TERCEIRIZAÇÃO DE ATIVIDADE FIM DO ESTADO


Projeto de lei da terceirização; entenda Projeto não estabelece limites ao tipo de serviço que pode ser terceirizado.

O noticiário vem noticiando a PL nº 4330/04 e provocando debates acerca do instituto da terceirização. Destarte, questiono se a terceirização tem algo de tão especial de modo que essa pequena palavra passa a ter conotações aterrorizante pra uns (Centrais Sindicais) enquanto remédio salutar pra outros (Firjan). Penso que nem um nem outro. De qualquer modo, caso Hegel ainda estivesse vivo, diria que há algo de cunho dialético transformador nesse momento histórico.
Imperioso voltar a 1988, ano da promulgação da Constituição Democrática Brasileira, nascida do pós-ditadura, trouxe em seu bojo tantas preocupações que a tornou extensa demais, visto que regula matérias de cunho constitucional como também de cunho não constitucional. Com o país calejado pelo populismo, facismo e ditadura, o legislador tentou coibir práticas dantes praticadas no sistema político brasileiro, instituindo a estabilidade do funcionário público estatutário. Ora, em seu art. 37, II da CRFB, o ordenamento jurídico passou acoibir as práticas de cooptação de servidores públicos por forças políticas, impedindo esses de transformarem aqueles em “massa de manobra”. À despeito da boa intenção legislativa, descurou-se o legislador das conseqüências advindas do “Homem Cordial” (Raízes do Brasil de Sérgio Buarque de Holanda), de modo que trouxe novos embaraços quando a sociedade brasileira teve que lidar com o servidor estabilizado que se sentindo diferente da plebe viu-se hierarquizadamente acima da lei e dos outros (Prof. Roberto da Matta).
Fazendo alusão ao cantor Cazuza, a vida não para, e realmente passou a andar mais depressa. No ano seguinte à promulgação da Carta Magna, em 1989, a cortina de ferro encontrava-se toda enferrujada e depauperada; sensível ao movimento o escritor John Williamson escreveu o texto entitulado “International Institute for Economy” em que se cuidava da globalização do sistema capitalista e como se daria. Esse foi a bíblia no “Consenso de Washington” ocorrido em 1991 que alinhavou as diretrizes da globalização, tendo em vista a hegemonia do sistema no cenário mundial. O cenário até então era de protecionismo, fronteiras muito controladas em função do legado da guerra fria, distinção entre padrão de vida de trabalhadores de países ricos, países comunistas e países de terceiro mundo. A nova ordem a ser alcançada se desenharia precipuamente com a internacionalização do capital e a internet se mostraria como excelente ferramenta, contudo alguma coisa estava fora da nova ordem mundial (Caetano Veloso); barreiras lingüísticas, culturais, políticas e etc. todas a serem vencidas. No Brasil, o velho jeitinho brasileiro em um de seus aspectos mórbidos que é o patrimonialismo autárquico, travestido de sistema democrático, onde todos fingem que obedecem a lei e quem governa finge que administra, dava sua graça de empecilho ao avanço do capital mundial. Sim, grande empecilho quando alguns se apoderam da máquina pública e outros despidos do ímpeto empreendedor passam a acotovelarem-se diante das tetas do governo. E tudo isso é às custas de pesadas cargas tributárias cada vez mais crescente. Daí uma das maiores características da política e economia brasileiras: não são distinguíveis os lados, de modo que esquerda ou direita, classe operária e empresários cometem os mesmos erros. Talvez seja aí nesse comenos, as críticas aos erros da esquerda denunciado por Gramsci, bem como as críticas de Boaventura de Souza Santos quando identifica no Estado a fonte dos problemas tanto do capitalismo moderno quanto do socialismo.
Todavia, voltando a análise de nossa CRFB/88, ela preve expressamente em seu art. 37,II a indispensabilidade do concurso público para provimento de cargos público, em razão (mens legis) de proteção ao sistema democrático que deve, como já dito acima, coibir o uso do funcionalismo como massa de manobra; tal entendimento recebeu chancela dos Tribunais Superiores, servindo-se o STJ do seguinte verbete: “a estabilidade diz respeito ao serviço público, e não ao cargo.” (RO em MS nº 859, 2ª Turma, Rel. Min. JOSÉ JESUS FILHO, julg. Em 11/12/1991.) Esse entendimento, a contrário sensu, deixava fora do instituto da estabilidade os cargos em comissão, temporários e empregados de empresas terceirizadas, justamente porque os primeiros são por natureza político, os segundos estão em razão da necessidade e urgência que condiciona sua utilização, e os terceiros são empregados de empresas que o Estado contrata para prestar serviços de apoio (atividade meio) ao serviço público principal (atividade fim), caso contrário a terceirização de atividade fim já seria por si só a burla ao imperativo do concurso. Ou seja, burla por via transversa.
Pronto, o quadro está pintado. Em se tratando de Brasil, patrimonialista e autárquico, onde o jeitinho mau utilizado faz com que o que parece ser não seja. O que era permanente passou a ser chamado de temporário, e vice e versa; outrossim, as repartições públicas com fins nem sempre probos, passaram a lançar mão da exceção que quase se tornou regra, razão pela qual o TST sumulou entendimento reforçando a regra do concurso público, contudo abrindo exceção em favor da terceirização por empresas privadas nas atividades meio (Súmula 331 do TST). Voltaremos nesse ponto mais adiante.
Do início da primeira década até a segunda deste século, houve a expansão do sistema capitalista, fazendo surgir a circulação de empresas em âmbito intercontinental em favor da busca de melhores condições de produção e maior produtividade e competitividade. Essa busca fez com que grandes empresas européias e americanas instalassem-se em países emergentes em razão dos precários ou ausentes regulamentos trabalhistas, bem como em razão de maior acesso a matérias primas. Eis que surgiu o BRICS, que nada mais são se não países em que o custo de produção é muito barato (mão de obra barata), ocasionando escassez de emprego em países ricos e levando a crises econômicas em razão das altas taxas de desemprego e etc. Para tanto basta observar os protestos na Espanha, Itália e Grécia. Esses países sentem atualmente a queda no padrão de vida do trabalhador.
Dentre os países do BRICS, o Brasil é o país que mais proteção ao trabalho tem, com uma forte legislação trabalhista e aparelhagem estatal (justiça trabalhista) que pretensiosamente mantém alguns direitos reconhecidos pela Constituição como Direitos Sociais. Noutro ponto, percebe-se que dentre todos os BRICS, à despeito de maior estabilidade social, saboreia pior crescimento econômico somado a grandes crises políticas em função de altas taxas de corrupção. Isso faz com que o investidor internacional evite empreender.
Essa encruzilhada vem sendo enfrentada pela arma da “Reforma Trabalhista” que vem recebendo até então grande oposição. Todavia, com a atual crise política nacional e instabilidade econômica no cenário mundial proveniente da crise de 2008 nos USA, o congresso nacional passou a buscar novas formas de diminuir o custo-Brasil e atrair mais investimentos.
Ultrapassando-se a reforma da previdência, a solução momentânea proposta é a TERCEIRIZAÇÃO DAS ATIVIDADES FIM do Estado; ou seja, Sem que contrarie a Constituição (imperativo do concurso) amplia-se a exceção (contratação de mão de obra para atividade fim por meio de empresas privadas).
É evidente que a atração de capital internacional e maior giro de riquezas na economia nacional é de bom alvitre, diria mesmo fundamental e providencial, embora não podemos esquecer que vivemos num país que nem tudo que parece é. Quais empresas irão contratar com o Estado se temos um histórico amargo de corrupção? Como evitar que essa mão de obra se torne simples massa de manobra? Qual será o custo desses contratos? Pois, das duas uma, ou se paga muito caro para cobrir o caixa dois, ou se paga muito pouco de modo que a mão de obra contratada seja a menos qualificada.
Não conheço sistema melhor que o liberalismo econômico, contudo, como praticá-lo se sabemos que isso nunca provamos, em razão de nossas raízes patrimonialistas (todos pendurados nas tetas do Estado) e autárquica (jeitinho que hierarquiza tudo e coloca o sujeito acima dos outros e da lei) tipicamente brasileiras.
Portanto, rememorando Cazuza, eu vejo o futuro repetir o passado; embora, gostaria que dessa vez não fosse assim. Precisamos de propostas novas e atitudes novas, logo precisamos DO NOVO.

TERCEIRIZAÇÃO DE ATIVIDADE FIM DO ESTADO

2 comentários sobre “TERCEIRIZAÇÃO DE ATIVIDADE FIM DO ESTADO

  1. Valdenilton Rodrigues de Oliveira disse:

    Por favor, preciso tirar uma dúvida: tenho 59 anos e 35 e alguns meses de contribuição; sou funcionário público municipal, concursado e sob o regime estatutário, certo? A pergunta é: quanto tempo tenho que trabalhar para ter direito a aposentadoria integral?

    Curtido por 1 pessoa

    1. Boa tarde meu caro. O seu caso como de muitos é necessário uma consulta. Posso lhe adiantar de ant passant que mais um ano será o suficiente para ficar com fator previdenciário nulo. Porém, se quiser um parecer mais aprofundado contacte-me pelo email.

      Curtir

Deixe um comentário